quinta-feira, 14 de maio de 2009

Ver para além do nosso umbigo...




Como professor há treze anos no IPB, participei numa manifestação de docentes do Ensino Superior Politécnico, ontem, em frente ao Ministério da Ciência Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) para alertar o Senhor Ministro de que a versão inicial dos novos Estatutos da carreira docente no ensino politécnico, para além de anunciar um "castigo" a quem demonstrou mérito e capacidade de trabalhar motivado mesmo em condições de precariedade, impropriamente afastado da carreira e de injusta retribuição salarial, teria indubitavelmente um impacto devastador na sobrevivência e qualidade do ensino Politécnico em Portugal.

Se o litoral do país sem Politécnico não fica desguarnecido de ensino superior, o interior perderia o mais poderoso motor de desenvolvimento do Portugal moderno nas regiões do Interior. Nisto não há palpites nem intuições, são factos confirmados, as cidades de Bragança, Guarda, Viseu, Castelo Branco, Portalegre e Beja devem em grande medida aos IPs o desenvolvimento sustentado das duas últimas décadas. Criar as condições nefastas de limitar a 30% - ou mesmo a 50% - o pessoal efectivo, ou seja, aquela equipa que constitui o núcleo perene de funcionamento em termos de leccionação, investigação e apoio à comunidade é sentenciar os Politécnicos das cidades do Interior à morte lenta, num ciclo vicioso de redução de discentes, docentes, serviços e retorno para a comunidade e para o país. Sim, ninguém tenha dúvidas que um Politécnico forte é impossível com metade dos professores como uma espécie de turbo-professores que apressadamente emprestam meia dúzia de horas aos alunos para lhes transmitir algumas luzes da sua especialidade. Ainda no âmbito do Politécnico, desempenhar funções directivas no Instituto ou nas Escolas ou outras equivalentemente intensas nos conselhos científicos, pedagógicos e na coordenação departamental, orientar teses de mestrado, integrar ou mesmo dirigir centros de investigação, requer professores de carreira em exclusividade em número significativo. Dando como exemplo da minha Escola, cerca de 10% dos professores de carreira estão "absorvidos" por funções supra lectivas. No pior dos cenários, restariam apenas 20% dos professores de carreira para suportarem e regerem a parte lectiva, certamente a mais importante, a investigação e actualização permanente, as parcerias, a realização de eventos, etc. etc. etc.


Penso que já ficou claro que a proposta inicial estava totalmente ao contrário, 30% deveria ser o número de convidados em tempo parcial e 70% deveria ser o mínimo de professores de carreira em exclusividade. Espero que o Senhor ministro reflicta melhor e saiba antever as consequências das suas decisões. Reduzir os custos de funcionamento dos Politécnicos pode redundar em aumentar em muito os custos para Portugal.

Falando agora como o representante do MMS no distrito de Bragança, orgulho-me de ter defendido o Ensino Politécnico e a minha região, vendo para além do meu umbigo. Critico os deputados da região por não anteverem o desastre que constituiria para a região a aprovação de um Estatuto tão penalizador da sustentação do Ensino Politécnico, especialmente nas regiões mais interiores e mais desfavorecidas. Os deputados locais do PS e PSD deveriam ter estado ao nosso lado para ouvir as nossas preocupações, afinal devia ser para defender a região que foram eleitos pelos votos dos eleitores do nosso distrito. Como já referi várias vezes, o ensino superior tem de ser uma aposta nas regiões interiores, aumentando a sua qualidade e consolidando estruturas de investigação e incubação de empresas co-localizadas, formando uma plataforma integrada de Ensino, I&D e transferência de tecnologia que moldassem definitivamente o desenvolvimento da região acolhedora.


Ficam os links das notícias publicadas sobre a manifestação e "reposicionamento" da tutela, congratulando-me por em duas delas a causa do Interior ter sido focada. Obrigado!

http://jn.sapo.pt/PaginaInicial/Nacional/Interior.aspx?content_id=1229939

http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1380186&idCanal=58

http://aeiou.expresso.pt/gen.pl?p=stories&op=view&fokey=ex.stories/514109

Abraço,
Sérgio Deusdado

2 comentários:

Sérgio Bernardo disse...

Caro Sérgio Deusdado

Apesar da minha insignificância, dada a importância do assunto, decidi publicar integralmente este post no meu blogue pessoal, A Textura do Texto.

Cumprimentos

Sérgio Deusdado - MMS Bragança disse...

Muito agradecido caro Sérgio Bernardo,

De facto, trata-se de um tema importante para o país, sobretudo para o país interior. E quem pensar que pode algum dia ter um país desenvolvido e a competir de igual para igual com os demais parceiros europeus investindo apenas em metade do território engana-se redondamente.

Abraço,
SD

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